31/10/06

Aparição num dia de inverno



"Um dia, lendo este poema, lembrar-te-ás:
o amor falou através dele. Ouvirás no seu ritmo
a voz que tantas vezes desejaste; reconhecerás
nos seus versos o corpo que encheu
a tua vida; tocarás em cada uma das suas palavras
os dedos que te ensinaram a medir os dias
pelas suas contas de ternura. E o tempo
entrará por ti como esse rio que alagou os campos
do inverno. Olharás à tua volta, vendo a desolação
de uma paisagem inundada. Algures, porém,
uma árvore antiga sobressai; e os seus ramos
verdes dar-te-ão a esperança de uma nova
primavera, em que voltes a ouvir a voz
que o poema te trouxe com os seus dedos
de música."


Nuno Júdice, A a Z
Somos feitos de tudo e ao mesmo tempo de nada, de fragmentos que dão razão à existência da ALMA.

A titulo de informação:
o novo Museu Mar da Língua, museu sobre a lingua portuguesa e os decobrimentos tem a sua abertura prevista para 2008,a noticia pode ser encontrada aqui e aqui

29/10/06

Mãos Vazias


"Quero um poema puro, um poema duro,
Um poema grito.
Quero um poema estrondo, um poema urro,
Um poema bramido.
Quero um poema guerreiro, um poema aguerrido,
Um poema combate.
Quero um poema bomba , que tudo destrua,
Que tudo arrase…
….
E quero caminhar sobre as cinzas,
E descobrir os meus pedaços,
E reconstruir o presente,
E soltar o meu grito de combate:
Eis-me!
Dura, inteira, guerreira!
Eis-me!
Caneta-arma,
Caneta-amor!
Soltando o meu poema duro,
Cantando e chorando a dor.
Gritando o meu poema urro,
Entoando cantos de amor.
E dando-me em cada verso.
E entregando-me em cada poesia.
E ficar só…
Tão só no fim do poema,
Estendendo as mãos vazias."


Erotismo na Cidade, Encandesceste

26/10/06

Transe



... de Teresa Villaverde, retracta a vida de Sonia, uma jovem russa que cai nas teias do tráfico de mulheres e consequentemente na prostituição.

Tema que poderia levar ao sentimentalismo gratuito, o que não se passa, leva-nos sim, apesar da temàtica, a uma poética das trevas em que o espectador vai construindo a história através das peças subtis que o silêncio nos dá, tornando-se, como diz Heiddegger, o modo autêntico da palavra.

17/10/06

Noções


"Entre mim e mim, há vastidões bastantes
para a navegação dos meus desejos afligidos.

Descem pela água minhas naves revestidas de espelhos.
Cada lâmina arrisca um olhar, e investiga o elemento que a atinge.

Mas, nesta aventura do sonho exposto à correnteza,
só recolho o gosto infinito das respostas que não se encontram.

Virei-me sobre a minha própria experiência, e contemplei-a.
Minha virtude era esta errância por mares contraditórios,
e este abandono para além da felicidade e da beleza.

Ó meu Deus, isto é minha alma:
qualquer coisa que flutua sobre este corpo efêmero e precário,
como o vento largo do oceano sobre a areia passiva e inúmera..."

Cecília Meireles - enviado pela minha querida Amiga Giza.

04/10/06

Esplendor na relva


"What though the radiance which was once so bright
Be now for ever taken from my sight,
Though nothing can bring back the hour
Of splendour in the grass, of glory in flower;
We will grieve not, rather find Strength in what remains behind.“*


Tradução livre:

Aquele brilho outrora tão resplandecente
Dos meus olhos se ausentou para sempre
E agora, apesar de perdido o esplendor na relva
E o tempo de glória em flor,
Em vez de chorarmos, buscaremos força
No que para trás deixamos.

* Parte do poema " Intimations of Immortality" de Willian Wordsworth, retirado do filme "Esplendor na relva" de 1961, escrito por Willian Inge com a interpretação de Natalie Wood, Pat Hingle e Warren Beatty.